domingo, 15 de agosto de 2010

Ódio contra nordestinos é recorrente na internet

Reportagem no Portal Uol demonstra como o ódio aos nordestinos em São Paulo ainda não é coisa do passado. Muitas comunidades da internet apresentam os nordestinos como verdadeiros outsiders na sociedade paulistana; mensagens carregadas de teor racista e preconceituoso são recorrentes, tais como afirmar que os nordestisnos sujam a cidade de São Paulo, emporcam a cidade etc. Como afirmou Nobert Elias, os estabelecidos constroem barreiras para impedir a integração dos recém-chegados.


Comuns na web, comunidades que expressam ódio a nordestinos são alvo da PF e do MP
Carlos Madeiro
Especial para o UOL Notícias

Em Maceió
A propagação de comunidades na internet com mensagens de discriminação contra nordestinos está sendo questionada pelo Ministério Público de Pernambuco e investigada pela Polícia Federal. A polêmica sobre referências preconceituosas foi denunciada ao MP em junho, logo após as enchentes que atingiram as cidades de Alagoas e Pernambuco.
O pivô da revolta foi uma comunidade do Orkut intitulada “Odeio Nordestino”, que abriu tópicos para "lamentar a sobrevivência" das vítimas enchentes e manifestar temor por uma “nova invasão” de nordestinos a São Paulo. “Pessoal, com essas enchentes no Nordeste acho que os cabeçudos vão vir em massa pra SP. Vai ter mais lixo do que já tem aqui”, afirmou uma frequentadora da comunidade. “Seria bom se eles morressem na enchente, afinal nordestino é um animal que não sabe nadar”, disse outro.
Mas não são apenas ataques às vítimas das enchentes que são encontradas na internet. Numa rápida busca, é possível ver que existem vários sites e comunidades de supostos moradores do Sul e Sudeste do país com ataques a nordestinos.
Na comunidade "Lugar de nordestino é no Nordes", com 154 membros no Orkut, um dos tópicos de comentários diz que os "nordestinos estão prejudicando os paulistas". "Peço que os paulistas expulsem os nordestinos de nossas terras, pois além de roubarem nosso espaço, ainda tiram onda dos paulistas", afirma a usuária Patrícia. "Voltem para o rebanho de vcs (sic) carniça", escreve uma usuária.
Os exemplos discriminatórios não se restringem ao Orkut. “Essa comunidade é para todos os paulistas, paulistanos e sulistas que estão cansados de ver e ter que aceitar esses ‘forasteiros’ usurparem da nossa terra, trazendo costumes imundos, emporcalhando as cidades, aumentando a criminalidade e agindo como se essa terra fossem deles”, diz um trecho do site “Desabafo Brasil”, que sugere que os usuários ingressem em sites preconceituosos.
Outro exemplo está num texto intitulado “manifesto confederalista”. "Quantas vezes você, paulista, presenciou cenas de desrespeito praticado por migrantes? Invadirem espaços, agirem como se estivessem em sua terra. Imporem sua cultura e costumes à nossa vontade. Inundam nosso estado, exigem serviços, põem-se de 'vítimas', apagam nossa identidade. Assim somos desrespeitados", diz o texto de apresentação.


MP pede providências
Diante das denúncias apresentadas no período pós-enchentes, o MP decidiu investigar as pessoas que fazem parte destas comunidades. A denúncia original foi contra a comunidade “Odeio Nordestino”. “Essa comunidade não é de uma ou duas pessoas, mas sim são cerca de 400 pessoas. E nós constatamos ofensas, preconceito, racismo, formação de quadrilha. E esse comportamento, além de criminoso, é perigoso, pois incita violência”, afirmou o promotor José Lopes Filho, coordenador da área de crimes contra a ordem tributária do MP de Pernambuco.
Com a repercussão do caso no Estado, os moderadores da comunidade apagaram os comentários que atacavam as vítimas das enchentes e restringiram o acesso ao conteúdo – agora, para participar, é preciso ser aprovado.
Segundo o promotor, o MP-PE acionou o MP federal e o de São Paulo (suposta origem do crime) e deu entrada com uma notícia-crime na PF. Várias comunidades do Orkut foram denunciadas. "Todo o trabalho acontece em sigilo pela PF. Essas investigações são demoradas; às vezes leva meses. É preciso rastreamento, quebra de IP [endereço de identificação de um computador], até mesmo procedimentos internacionais. Eu estive com o relações públicas da PF na última semana e ele me informou que as investigações estavam de vento em popa", afirmou Lopes.
O promotor disse que conseguiu chegar ao IP dos usuários da comunidade. "Eles começaram a criar fakes [nome de usuário falso], mas nós conseguimos rastrear o IP dessas pessoas. Isso facilita identificar o usuário. É preciso pedir o horário GMT para sabermos exatamente de onde partiu os comentários. Todos os dados que conseguimos foram entregues à PF.”
Segundo o promotor, os integrantes das comunidades anunciaram até a posse de artefatos explosivos. “Essas comunidades podem ter vinculações com grupos neonazistas. Talvez essa análise desbarate até quadrilhas. Se identificados, essas pessoas podem ser condenadas por racismo, preconceito e, eventualmente, por formação de quadrilha e apologia ao crime”, informou.
Lopes ainda criticou a empresa Google, detentora do Orkut, que se recusaria a retirar do ar comunidades com conteúdo racista. "Eles se valem da lei norte-americana, da independência que possui por ser de outro país”, disse o promotor.


Comunidades de apoio
Depois da repercussão do ataque às vítimas das enchentes, muitas comunidades de apoio aos nordestinos foram criadas e outras, mais antigas, ganharam adeptos. A principal delas, intitulada “Orgulho de Ser Nordestino”, possui hoje mais de 133 mil membros, e tem vários comentários de pessoas que passaram por casos de discriminação.
Já outras comunidades foram criadas recentemente para criticar o preconceito de supostos moradores do Sul e Sudeste. Na comunidade “Eu odeio quem odeia nordestino”, por exemplo, muitos usuários pedem que os internautas denunciem as comunidades que expressam preconceito contra os moradores da região.

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